Há 30 anos tomava posse de meu cargo de escriturário do Banco do Brasil, vaga conquistada por concurso público
Dia 9 de setembro de 1992, numa segunda-feira, me dirigi logo cedo para a agência Rua Clélia, na região da Lapa, bairro de São Paulo, para tomar posse da vaga de escriturário do Banco do Brasil, após cumprir todas as etapas anteriores na área de gestão de pessoas do banco público.
Prestei o concurso em 1991 e após ser aprovado tive que fazer novamente as provas porque o resultado foi cancelado por fraudes ocorridas em Brasília (DF). Felizmente passei novamente e lá estava eu dia 9 de setembro para começar a trabalhar no maior e mais antigo banco público do país. Aquele dia mudou a minha vida.
Ao me atentar à data de hoje, 9 de setembro de 2022, comecei a me lembrar de alguns momentos dessa relação de uma vida inteira entre um cidadão e uma empresa, me lembrei de diversas experiências que vivi como funcionário dessa instituição pública tão importante na história do Brasil e do povo brasileiro desde o início do século 19.
Eu me lembro que ainda nos primeiros anos de trabalho, lá na Rua Clélia, tive propostas para sair do BB e ser sócio de empresa de contabilidade, pois eu havia me formado em Ciências Contábeis. O senhor Luís, um cliente do banco, queria de todo jeito que eu fosse sócio da empresa dele. No BB, nós vivíamos o inferno na Terra com o governo de FHC (PSDB): demissões, perseguições, suicídios de colegas, PDV, o terror. Acabei optando por ficar no banco.
Agora mesmo, enquanto escrevo, são muitas lembranças dos primeiros anos de trabalho no BB, lembranças que vão se alternando em minhas memórias. O que me tornei pra vida toda teve muito a ver com o que vivenciei nos primeiros anos de banco, na relação com os colegas de trabalho e com o sindicato de nossa categoria.
Hoje entendo que sempre tive uma natureza de servidor público, de querer servir à coletividade, de ajudar e atender às pessoas. Nunca seria um "empresário", um capitalista. Isso não tem nada a ver comigo.
Foram 10 anos atuando no dia a dia nas agências bancárias, mais de 9 anos como caixa executivo, atendendo a clientes e público em geral. Depois vieram os desafios da representação dos colegas bancários: 4 mandatos no Sindicato dos Bancários, 3 mandatos na Confederação e um mandato na direção de nossa autogestão em saúde.
Foram quase 27 anos de trabalho em nosso querido Banco do Brasil, sim, "querido" porque o BB pode e deve continuar sendo um agente do desenvolvimento do Brasil e do povo brasileiro, e isso nos dá um orgulho imenso em pertencer a essa instituição, a essa comunidade, a essa história do Brasil.
A FORMAÇÃO POLÍTICA ATRAVÉS DO MUNDO DO TRABALHO
Vejamos meus primeiros ensinamentos do mundo do trabalho em uma grande empresa...
Eu era estagiário do Banco do Brasil na agência do Ceagesp no ano de 1992. O estágio era pelo fato de eu ter começado a cursar faculdade de Ciências Contábeis. O dia a dia no local de trabalho sempre tinha debates e reflexões sobre a política nacional e o mundo do trabalho. Eu só havia experimentado algo parecido durante os dois anos que passei no Unibanco (1988-1990) porque lá conheci o pessoal do Sindicato, me sindicalizei e ajudei a organizar uma greve.
Naquele ano de 1992 o Brasil inteiro acompanhava as denúncias de corrupção do governo Collor e nos bancos sempre havia as fortes mobilizações da data-base da categoria em setembro. No Ceagesp vi muitas análises sobre a campanha dos bancários do ano anterior, uma campanha difícil que havia sofrido reveses por interferência dos tribunais de justiça, sempre favoráveis aos patrões e governos.
Aí comecei minha vida de funcionário do BB. Achava que a vida de jovem brasileiro seria bem melhor por trabalhar numa grande empresa estatal. Mal cheguei ao banco e chegou ao governo federal o social-democrata Fernando Henrique e o massacre do funcionalismo público começou também...
O aprendizado da organização nos locais de trabalho (OLT) foi acelerado, foi na veia. Havia organização tanto interna quanto com o apoio do Sindicato. O alvo do governo eram os trabalhadores mais antigos de banco, com maiores direitos sociais acumulados em décadas de lutas sindicais.
Me arrepio e me emociono só de lembrar o quanto meus colegas sofreram com os ataques perpetrados pelo governo e pelos meios ideológicos dos privatistas - a tal imprensa secular, a voz da casa-grande contra as senzalas, contra a classe trabalhadora.
Como disse acima são tantas memórias que vêm umas atrás das outras ao me lembrar da minha história na comunidade de trabalhadores da ativa e aposentados do Banco do Brasil que se eu deixasse os dedos registrarem as lembranças faria um texto enorme.
Posso resumir neste 9 de setembro de 2022 que o homem que me tornei é o resultado do aprendizado de três décadas de convivência com o mundo do trabalho numa grande empresa com organização interna por parte dos trabalhadores, é resultado de ter pertencido a uma grande categoria com sindicatos fortes e organizados.
O cidadão com consciência política que me tornei é resultado direto sobretudo da oportunidade que tive de representar com mandatos eletivos meus colegas de trabalho por quase duas décadas.
Hoje não estou mais no dia a dia dos trabalhadores do Banco do Brasil e da categoria bancária, mas carrego comigo a politização que aprendi das lutas sociais e coletivas, e procuro acompanhar as questões do mundo do trabalho e dos direitos sociais da forma que meu cotidiano particular me permite neste momento.
Desejo que o Banco do Brasil e todas as associações por nós criadas ao longo de mais de um século permaneçam em nossas vidas por muito tempo, desejo que as empresas públicas sejam preservadas e fortalecidas e que os direitos sociais voltem a ser conquistados pelo povo brasileiro após encerrarmos esse período devastador que vivemos com o crime organizado ocupando espaços de poder no Brasil.
Espero que em outubro possamos virar a página dessa tragédia que vivemos com a destruição do país e de nosso mundo da classe trabalhadora*.
Eu voto #Lula13Presidente porque quero o melhor para o Brasil e para o povo brasileiro.
William Mendes
*Lula foi eleito pela 3ª vez presidente do Brasil em outubro de 2022.
Para ler o texto anterior, Memórias (XXX), clique aqui. O texto seguinte, pode ser lido aqui.
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