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7.4.23

Memórias (XXXVII)



Sou um dos milhares de militantes do movimento social brasileiro de esquerda que torcem diariamente por nosso governo e pela classe trabalhadora

Osasco, 7 de abril de 2023. Sexta-feira Santa.


Estamos no mês de abril. Ano ímpar. No país onde vivo e na comunidade à qual pertenço - funcionários da ativa e aposentados do Banco do Brasil - não temos corridas eleitorais no país, nem na Caixa de Previdência (Previ) nem na Caixa de Assistência (Cassi). Temos eleições sindicais e associativas em algumas de nossas entidades bancárias. O Sindicato ao qual sou associado há 3 décadas terá eleições com chapa única, então todos nós votaremos na Chapa 1 para fortalecermos as companheiras e companheiros que nos representam na organização do movimento sindical.

A nossa Caixa de Assistência disponibilizou seu Relatório Anual nesta semana e os associados e associadas terão direito de se manifestar sobre ele nos próximos dias. Já tentaram retirar o nosso direito de manifestação na Cassi assim como nos foi retirado por intervenção externa na Previ, ainda no período do governo do PSDB, se não me falha a memória (intervenções em 2001 e 2002), mas na Cassi nós interviemos a tempo e nossa manifestação segue garantida. Eu tenho uma viagem marcada para as próximas semanas e isso tem me tirado um pouco do tempo livre para leituras e estudos. Estou um pouco focado na viagem que farei*.

Fico me perguntando se leio o Relatório Anual 2022 com olhar crítico ou se simplesmente voto "sim" seguindo as recomendações dos colegiados que já leram e aprovaram as contas e as decisões estratégicas que a direção de nossa Caixa de Assistência tem tomado nos últimos anos, e no ano de 2022, ano ao qual o relatório faz referência. São 165 páginas e para uma leitura adequada, do meu jeito, teria que ler outro relatório, de outro ano a escolher, para poder ter uma referência em relação ao que fizeram com a nossa Cassi. Não sei realmente se vale a pena esse esforço com o tempo que me resta antes da viagem ou se deixo pra lá. Tenho responsabilidade e não faria manifestações indicando rejeição do relatório porque isso é ato político menor. Ler o relatório seria mais para ter consciência e noção do que estou votando, apenas isso.

Até dezembro de 2022 eu tinha leitura clara a respeito do que estavam fazendo com a nossa Caixa de Assistência, era o governo Bolsonaro que regia a nossa autogestão e o patrocinador Banco do Brasil, era Bolsonaro que indicava a metade da gestão e a outra metade era eleita por nós associados. Então tenho uma boa noção do que vieram fazendo com a nossa Cassi até o final do mandato de Bolsonaro: terceirização absurda e desnecessária e mudança radical no modelo assistencial de ESF para outra coisa, que chamaram de APS. Até Lula, que não é nenhum esquerdista radical, ficou chocado com a terceirização no Palácio do Planalto, e disse que iria mandar rever aquilo. Será que a fala do presidente da república vale para o BB e para a Cassi?

Só que agora em 2023 a direção indicada não é mais responsabilidade daquele sujeito apreciador de armas, violência e joias. Agora a responsabilidade do que acontecer na Cassi e no Banco do Brasil e na Previ e nas nossas instituições públicas ou de economia mista ou com ligação com estas será do presidente Lula. E sou eleitor e apoiador do governo eleito por nós. Se o nosso governo fizer coisas ruins para o Brasil e para nós, todos nós teremos um pouco de responsabilidade, assim como nenhum álcool-gel desinfeta as mãos de quem votou em Bolsonaro e tudo o que ele significa e fez. O sangue derramado pela política de ódio de Bolsonaro segue sendo responsabilidade de quem votou e apoia ele.

INVISIBILIZAÇÃO...

Eu nunca soube por que fui cancelado e apagado da história que ajudei a construir no movimento sindical bancário e na comunidade do Banco do Brasil por parte de algumas lideranças do movimento sindical de onde tenho origem, nunca soube e isso é que é estranho. Nós tínhamos a prática de nos reunirmos em avaliações políticas sempre que chegavam os momentos de definições de novas chapas e composições políticas para qualquer de nossas entidades. Às vezes eram debates duros, mas eram francos, honestos, até fraternos, mesmo quando decidíamos em coletivo que alguém não faria mais parte dos colegiados que estávamos montando. Isso não aconteceu comigo. 

Até hoje eu não sei por que o meu Sindicato decidiu me excluir das discussões políticas que aconteceriam para o ano calendário de 2022, quando a nossa coordenação política na Contraf-CUT chamou reuniões nos fóruns sindicais para definir as políticas que adotaríamos para as eleições de Previ e Cassi para o ano de 2022. Simplesmente, não fui incluído nas discussões que aconteceriam naquela semana de dezembro de 2021. Até a véspera, eu fazia parte da coordenação da Articulação Sindical do grupamento do Banco do Brasil. Participava e contribuía com estudos, textos, pesquisas, palestras, auxiliava em negociações sobre a Cassi, assessorava etc. Simplesmente na semana do início das discussões fui cancelado, e ponto. Por quê?

CAMPANHA UNIFICADA - Meu histórico no movimento sugeriria um pouco mais de respeito. Me lembro de quando iniciamos as discussões sobre campanha unificada entre bancos públicos e privados no início do governo Lula. A companheirada dos públicos era contrária à proposta, era um debate justo. Com Lula eleito, achavam que tinham que recuperar sozinhos tudo que nos tiraram na década de noventa. As oposições bancárias à CUT e Articulação Sindical eram fortes oponentes à campanha unificada. Como jovem liderança do maior sindicato do país e da Articulação, viajei às bases com mais bancos públicos para fazer o debate fraterno e convencer as lideranças do acerto da campanha unificada. Tudo deu certo e o movimento ganhou muito com esse acerto. Assim como essa história, em muitas outras tive participação importante, eu e várias pessoas hoje esquecidas ou canceladas.

A vida seguiu para todo mundo, lógico. Eu segui militando nas ruas, nas campanhas contra Bolsonaro e a favor de Lula e da democracia, nos contatos que sempre tive com o país todo, mesmo diminuindo porque fui apagado depois de dezembro de 2021, quem é do movimento sabe como isso funciona. Depois encontrei um espaço na militância do Partido dos Trabalhadores da região onde moro, o pessoal da região faz um trabalho de base muito bonito, digno, do jeito que aprendi no movimento sindical. Nunca mais fui ouvido sobre os assuntos que mais entendo e acumulei em décadas, os assuntos sobre a história de lutas e conquistas do movimento sindical e a Cassi, por exemplo, que estudei mais que tudo na vida durante os 4 anos em que fui diretor de saúde e dei a minha vida e a minha saúde defendendo os direitos dos associados e o modelo de saúde. Nenhum direito foi perdido até o dia em que estive lá. Nenhum.

Tenho comigo que esse cancelamento e invisibilização é um pouco a característica do que nós viramos no movimento sindical e político no campo da esquerda brasileira. Isso nos enfraquece. Não adianta eu ficar elucubrando os porquês do que nosso Sindicato fez comigo, tenho leitura de diversas possibilidades para explicar os motivos de ser excluído das discussões políticas do grupo ao qual ajudei a construir em décadas, mas nunca me foi dito formalmente por que me excluíram. Isso não foi algo digno do que nós construímos nas últimas décadas. No entanto, a cada dia de vida entendo mais como as coisas funcionam, é algo até chato, mas a gente vai compreendendo o mundo onde vivemos.

Sigo na torcida pelo sucesso do nosso lado da classe, a classe trabalhadora, de nosso governo Lula, e de nossas lutas dos trabalhadores e trabalhadoras, lideradas por nossas entidades de classe.

Como diz o jornalista Ricardo Kotscho, vida que segue.

William


*Foi minha primeira viagem para Cuba, uma república socialista localizada no Mar do Caribe. Passei duas semanas por lá e a experiência foi muito interessante.


Post Scriptum: o texto de Memórias anterior pode ser lido clicando aqui. O capítulo seguinte pode ser lido aqui.

Post Scriptum II: ano passado, na ocasião do 99º aniversário do nosso Sindicato, fiz um texto de Memórias, caso tenham interesse é só clicar aqui. Nele, falo da questão de minhas andanças defendendo a campanha unificada e minhas relações com a base. (lógico que esse texto me faz chorar rsrs)