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14.8.25

Diário e reflexões


17/04/16, o dia que deixei de acreditar na "democracia"

Reflexões

Quinta-feira, 14 de agosto de 2025.


Tive o privilégio de participar, nesta noite fria de quinta-feira, de uma excelente roda de conversa na Comunidade do Paredão, Rio Pequeno. O encontro foi no espaço "Cozinha Popular Dona Nega", importante espaço criado pelo Movimento Brasil Popular em parceria com o MST e lideranças locais para combater o flagelo da fome e insegurança alimentar no Estado e na cidade mais ricos do país, São Paulo.

Voltar ao Jardim Ivana/Rio Pequeno é voltar ao início de minha jornada de vida, à origem de minha caminhada pela Terra. Nasci ali, na rua em frente à padaria da Cinco Quinas, saí dali aos dez anos e aos dezessete voltei, morei ali em fases diferentes de minha vida. Ali me alfabetizei, ali terminei o ensino básico antes da graduação superior. Ali peguei ônibus lotado, vivi enchentes, o Rio Pequeno. 

Ouvir o companheiro José Genoino contando um pouco de suas vivências e suas opiniões sobre as questões mais destacadas no grave cenário político do país e do mundo é uma oportunidade que nenhum militante das causas sociais poderia perder quando é convidado para uma agenda dessa natureza. O bate-papo foi excelente!

Além de ouvirmos Genoino, ouvimos lideranças inspiradoras da Frente de Solidariedade e Luta da Zona Oeste (FSL/ZO), que militam em diversas frentes de lutas na região do Butantã. A gente sai da reunião com uma humildade incrível ao ouvir pessoas tão envolvidas com as causas sociais centrais para o povo e a classe trabalhadora.

Revi companheiros de longa data como o amigo Daniel Kenzo, Jurandir, amigo desde o movimento estudantil na USP, Ernesto e Sérgio e demais militantes queridos do movimento na região Oeste.

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Fui para a roda de conversa com diversas questões em meus pensamentos. Meu momento é de mais compreensão das coisas da vida do que antes. Ter a percepção que sinto ter não me dá conforto algum, me dá uma permanente agonia. Tudo bem, foi para isso que estudei e tentei evoluir mentalmente nas últimas décadas de vida.

O assassinato de Laudemir, trabalhador da limpeza urbana de Belo Horizonte, um gari, por um desgraçado que é o modelo de "cidadão" exaltado pela sociedade humana do capital, me encheu de ódio e raiva, sentimento que voltei a sentir desde o dia 17 de abril de 2016, desde aquela sessão no Congresso Nacional na qual um sujeito escroto enalteceu um torturador ao votar pelo impeachment sem crime da presidenta Dilma Rousseff. 

Em agosto daquele ano de 2016, o mesmo Congresso efetivou a perda do mandato presidencial da primeira mulher eleita no Brasil, eleita por 54,5 milhões de votos do povo brasileiro. 

Desde aquele ano, eu deixei de acreditar na democracia que conhecia como modelo político, entendi que as democracias que existiam na vida real eram farsas e arranjos para a manutenção do poder pelos donos do capital no mundo contemporâneo.

Uma das mulheres mais queridas de minha vida, a nossa tia Alice, irmã de minha mãe, era gari na cidade de Uberlândia, e ver um ser escroto como esse tal Renê "cidadão de bem" andar por aí mexeu com meus sentimentos mais antigos de ódio dessa gente que se acha melhor que os outros, essa gente da burguesia que odiei desde que tinha meus doze ou treze anos, quando me humilhavam como criança trabalhadora.

Quando entrei no movimento sindical, já tendo mais de trinta anos de idade, fui mudando diariamente pela convivência com pessoas maravilhosas, humanistas, pessoas boas como a tia Alice e outras pessoas humildes que eu conhecia. Mudei radicalmente ao longo da vida de representação da classe trabalhadora. Quando afirmo que fui politizado pelos bancários da CUT (nome do meu livro de memórias), é a mais pura verdade. A convivência com a companheirada me tornou uma pessoa melhor.

Com o golpe de Estado contra nós em 2016, a deposição da presidenta Dilma Rousseff, a operação lesa-pátria Lava Jato e a prisão do presidente Lula e outras prisões como a dos companheiros do PT, Genoíno, José Dirceu, Vaccari e outras lideranças de nossa história de luta, com a ascensão dos desgraçados que colocaram no poder entre 2016 e 2022, e a não convivência diária com tanta gente boa como aquela com quem me reuni hoje à noite, acabei por deixar aflorar em mim parte do ódio que senti boa parte da minha vida.

Com os exemplos diários de injustiça, violência, e impunidade de gente como esse assassino do Laudemir, gari como minha tia Alice, eu voltei a considerar a pena de morte como um instituto legítimo de punição para crimes no Brasil. Um desgraçado como esse Renê e tantos outros "cidadãos de bem, patriotas, blá blá blá" não merecem viver sobre a Terra.

Esse pensamento é um retrocesso em mim, de verdade. Quando virei dirigente sindical, gastei um tempão estudando o tema da pena de morte para passar a ser contrário a esse tipo de pena. Retrocedi como pessoa...

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Felizmente, a roda de conversa com gente boa de verdade, me fez amenizar um pouco tudo que eu ainda estava pensando, além de voltar a considerar a pena de morte, de preferência pena capital no estilo revolucionário para traidores, para esses desgraçados fascistas que se acham acima das leis e melhores que as outras pessoas.

William

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