Opinião
"Organizei uma série de reuniões entre líderes do CNA e dos CIAS, tanto banidos como ainda não banidos, para discutir os parâmetros do plano. Trabalhei nele por vários meses e criei um sistema que era amplo o suficiente para adaptar-se às condições locais e ao mesmo tempo não restringisse a iniciativa individual, mas detalhado o suficiente para facilitar a ordem. A menor unidade era a célula, que em assentamentos urbanos consistia em cerca de dez casas em uma rua. Um administrador de célula seria responsável por cada uma dessas unidades. Se uma rua contivesse mais de dez casas, um administrador de rua se encarregaria dela, e os administradores de células se reportariam a ele..." (MANDELA, Longa caminhada até a liberdade, 3ª edição, 2012, p. 179)
O momento descrito acima é do início da década de 1950 na África do Sul. Nelson Mandela e os demais líderes do Congresso Nacional Africano (CNA) suspeitam que o regime de minoria branca vai colocar o CNA na clandestinidade. Para se antecipar a isso, Mandela planeja uma forma de Organização de Base para que o movimento de resistência e defesa dos direitos dos negros não perca a capacidade de luta. A história da luta dos sul-africanos negros contra o apartheid é linda e uma referência para nós da classe trabalhadora oprimida no mundo organizado atualmente através do modo de produção e exploração capitalista.
Eu entrei no Banco do Brasil em setembro de 1992, após quase um ano como estagiário do banco e após passar duas vezes no concurso público para escriturário do maior banco público do país (em 1991 o concurso foi cancelado por fraude e os aprovados tiveram que passar de novo).
Já no final de 1993 eu havia feito o curso de caixa executivo e iniciava o atendimento aos clientes na bateria de caixa da agência Rua Clélia, na região da Lapa, em São Paulo. Foi uma oportunidade ímpar porque a fila para ir para a função de caixa era demorada, em geral se esperava muitos anos pela promoção. Como os colegas veteranos estavam negociando suas férias de fim de ano com a gerência, eu me coloquei à disposição para trabalhar no caixa nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro. Valeu a pena o esforço, pois virei caixa do Banco do Brasil com praticamente um ano de banco.
Atuei no atendimento aos clientes do BB como caixa por praticamente uma década, até o dia 5 de agosto de 2002, dia que fui liberado do local de trabalho, a agência Vila Iara, em Osasco, para cumprir o mandato de diretor eleito do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região. Tanto durante a década no atendimento aos clientes e nas lutas ao lado dos colegas do caixa, quanto no período em que fui dirigente, sempre lutei pela valorização dos caixas executivos do BB e tenho muitas histórias para contar. Durante toda a minha vida de militância sindical, sempre tive um carinho enorme e muita consideração pelos colegas que atuam na linha de frente no atendimento aos clientes, seja atuando nos caixas, nas mesas de atendimento e pelas formas telefônicas e virtuais.
O regime neofascista que assumiu o poder após o golpe de Estado de 2016 está atuando com rapidez para enfraquecer e privatizar as empresas públicas brasileiras. O Banco do Brasil é um dos alvos do desmonte. Uma reestruturação em andamento vai fechar agências e unidades, reduzir postos de trabalho e piorar o atendimento ao povo brasileiro (5533 colegas vão sair) e reduz salários e direitos de todo mundo. É O CAOS! O governo vai reduzir salários e oportunidades, e uma das sacanagens é acabar com a efetivação da comissão de caixa executivo. Só a luta com participação dos trabalhadores, movimento de dentro para fora, pode criar dificuldades a essa destruição de nosso banco público e da vida das pessoas.
Por que citei aquela passagem da luta dos negros sul-africanos contra o apartheid e por direitos plenos em seu próprio país? Porque a organização de base, ou Organização por Local de Trabalho (OLT) foi uma das primeiras coisas que aprendi como trabalhador da categoria bancária, uma categoria com forte organização sindical. O mundo pode ter mudado, a tecnologia e as novas formas de trabalho podem ter mudado, quase tudo pode ter mudado, mas a exploração do trabalhador não mudou porque continuamos caminhando para a destruição do mundo e da vida das pessoas pelo modo de produção capitalista.
O ano é 2021. O governo é um regime lesa-pátria, composto pelo pior tipo de gente da face da terra, e o momento é de ataques e destruição do patrimônio público e dos direitos sociais da classe trabalhadora. E a única forma de enfrentar os ataques e resistir é através de organização de base. Se posso sugerir alguma coisa para os colegas do Banco do Brasil e as entidades sindicais é que reorganizem o trabalho de base. Me parece que as pessoas colocam dificuldades em tudo e as desculpas são as mais diferentes, todas elas têm suas razões. Mas isso não impede que os trabalhadores organizem a base de luta contra todo o desmonte que está acontecendo no Banco do Brasil e demais empresas públicas.
Se uma base sindical tem 100 unidades do banco e 1200 trabalhadores e o sindicato local tem 25 diretores e mais alguns funcionários é só sentar e definir a organização de base como o Mandela explica acima. Não importa se o contato é presencial ou virtual, se estamos ou não em pandemia, se o ataque aos trabalhadores segue implacável. Uma pessoa pode ser a responsável por organizar uma pequena rede de contatos com 10 pessoas e 10 unidades. Pode conhecer essas pessoas, pode levar informações e trazer informações relevantes para a organização de luta e defesa do banco, do emprego, da vida e dos direitos das pessoas.
É possível organizar a base, fizemos isso a vida toda. Quando eu era responsável por algumas dezenas de locais de trabalho no sindicato, eu tinha um contato por local, conhecia o nome das pessoas, tinha alguma forma de contato de emergência etc. Até em mandato nacional, na Cassi, fiz trabalho de base e contribuí para fortalecer redes de lutas e defesa da Cassi. Amig@s, afirmo que ainda é possível organizar as bases de trabalhadores.
Eu poderia ficar horas escrevendo sobre isso, mas não é o caso. Sei que os sindicatos e os trabalhadores estão na luta da maneira que o momento de pandemia e crise permitem. Como farão plenárias nas bases sindicais hoje, quinta-feira 11, deixo a sugestão de pensarem formas de organização por células locais. Isso é mais antigo que andar para a frente, como dizem por aí, mas é necessário definir essa questão de organização em redes e fazer.
Organização de Base! Solidariedade de classe. Cooperativismo. Associativismo. Socialismo.
É o que acredito, realmente!
William
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