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10.4.22

Memórias (XXI)



O papel de educação em saúde que a Cassi tinha através do modelo de Estratégia de Saúde da Família (ESF) e das CliniCassi


Uma reflexão a partir do que aprendi com os profissionais de saúde da Cassi me fez abrir nesta manhã de domingo uma nova caixa de comprimidos para controle de pressão alta e tomar o comprimido que não tomei nos últimos dois dias. O modelo assistencial da Caixa de Assistência (a ESF) atuava para que o próprio participante do sistema fosse protagonista de seu destino no que diz respeito à saúde e à vida. Esse é um dos focos da medicina de família e comunidade, modelo exitoso onde é implantado: educação em saúde e participação ativa do usuário.

Ao terminar a caixa de remédio anterior, pensei em esperar para voltar a tomar os comprimidos de controle de pressão alta somente quando pudesse agendar uma consulta à Cassi, isso se daria após fazer os exames de rotina que pedi para fazer depois de dois anos sem controle algum por causa da pandemia mundial de Covid-19. Estou falando de exames básicos de sangue, urina etc. Como quase todos nós somos relapsos quando se trata da própria saúde, já faz um certo tempo que estou enrolando para fazer os exames de rotina. Vai saber quando é que vou efetivamente passar com a equipe de família com os exames realizados.

Milhões de pessoas no Brasil e no mundo morrem ou sofrem sequelas de infartos e AVC em consequência de não controlarem as principais doenças crônicas que acometem uma quantidade enorme de gente nas mais diversas idades. As doenças crônicas são silenciosas e a grande maioria das pessoas não sabe que é doente crônica. Uma questão básica de atenção primária na medicina de família e comunidade é acompanhar e monitorar casos de pressão alta, diabetes e níveis de colesterol de pessoas cadastradas em equipes de família.

Eu pertenço a um sistema de saúde privado - a Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, uma autogestão em saúde - que desenvolveu um modelo assistencial desde o final dos anos noventa baseado na Estratégia de Saúde da Família (ESF), uma das formas de Atenção Primária em sistemas de saúde. Como participante cadastrado na ESF, tive a oportunidade de ser orientado sobre saúde após 2014. 

Enfim, não vou começar o blá blá blá sobre o modelo assistencial da Cassi na atualidade e sobre a destruição dele a partir de 2018 com a eleição de pessoas de um tal grupo de liberais autodenominado Grupo Mais. Esse não é o foco desta postagem de memórias. Aqueles colegas eleitos em 2018 e 2020 se uniram a outros indicados pelo patrocinador para desfazer o modelo próprio de saúde (ESF/CliniCassi) e terceirizar o cuidado de nossas vidas para os capitalistas do mercado de saúde. 

Retomando minha reflexão sobre voltar a tomar o comprimido de controle de pressão alta nesta manhã de domingo, ela se deu por causa dos ensinamentos que adquiri a partir de 2014 ao ser um participante cadastrado em uma equipe de família no modelo ESF da Cassi, e ter tido as orientações preventivas basilares sobre causas e consequências em relação às doenças crônicas e seus agravamentos caso as cronicidades não sejam controladas e monitoradas. 

Não é preciso ser da área da saúde para ser orientado como ser humano que alterações na pressão arterial, colesterol alterado ou diabetes podem ocasionar sérios riscos a órgãos internos como cérebro, rins, fígado, olhos, veias e artérias, coração, pulmão etc. Sistemas circulatório, respiratório, endócrino e nervoso podem sofrer danos irreparáveis sem o controle da pressão e dos níveis de colesterol. 

Nos primeiros dois dias sem tomar o remédio minha pressão arterial seguiu boa: 12x8. No entanto, nesta manhã vi que ela já havia se alterado para 13,5x10. Refleti então que não tomar o comprimido e me expor a um ataque cardíaco ou a um AVC seria uma coisa estúpida, burra. Eu não tenho medo de morrer, mas não gostaria de ser um sequelado de um infarto ou AVC se isso puder ser evitado. Além disso, como ser social seria estupidez me expor a um risco desnecessário sendo que quase todos nós temos pessoas em nossas relações que sofreriam com nossa ausência, tanto de forma psicológica quanto financeira.

Acho que paro essas memórias por aqui. Ter sido gestor do modelo de saúde da Cassi entre 2014 e 2018 me deu conhecimentos que me impedem de ser tão irresponsável com minha saúde como era antes. É lógico que sigo sendo um cidadão que vive inserido numa cultura inversa ao modelo que a Cassi perseguia, preventivo e que monitorava a população cadastrada ao longo de toda a vida. Ou seja, sem um trabalho ativo das equipes de saúde da ESF, minha tendência é a da maioria, só procurar o sistema quando estiver com algum problema de saúde, por dor, por incômodo, por "necessidade".

O modelo do mercado, ao qual a direção da Cassi optou por seguir, tem essa lógica de gerar procedimentos médicos e necessidades de eventos (ocupar leitos e vender serviços): se sentir alguma dor, se estiver doente, se quiser fazer algo que viu nas propagandas, faça uma teleconsulta, procure um profissional de saúde, um hospital ou clínica blá blá blá. Isso é uma tragédia para as pessoas e para os sistemas de saúde, por mais que elas não entendam isso! Quando os usuários fizerem suas demandas, a saúde deles já era...

O mercado, a indústria de procedimentos médicos, materiais e medicamentos agradecem aos gestores que optam pelo modelo curativo e não o preventivo. O lucro do mercado de saúde é com as nossas doenças agravadas, com o nosso "salvamento" ou assistência talvez longa até nossa morte. 

E o lucro do mercado de saúde também é com as nossas demandas por causas externas como a violência pregada pelo regime fascista no poder e os acidentes diversos que demandam leitos e atendimentos caríssimos. A Cassi optou por desfazer suas estruturas próprias e baratas de equipes de família, unidades de atenção primária CliniCassi e optou por apostar nos capitalistas do mercado de saúde.

Que os deuses diversos e a sorte nos protejam. 

William


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