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7.2.24

História dos bancários: um olhar (XIII)



A questão da saúde dos trabalhadores e as autogestões em saúde

Memórias e contribuições para reflexão (I)


Gosto da ideia de me considerar uma pessoa de sorte. O cidadão que sou hoje é o resultado de um conjunto de veredas que foram aparecendo em meu caminho existencial ao longo das décadas de vida. O que sou é o resultado das oportunidades que a vida me presenteou e o fato de ter abraçado algumas delas. Posso dizer que tem um componente de sorte ou acaso nisso.

Se passei a maior parte de minha vida laboral trabalhando em uma instituição financeira, um banco público, isso não foi algo desejado ou planejado pelo adulto jovem das décadas de oitenta e noventa. As veredas foram surgindo e o trabalhador foi indo por uma ou outra trilha. É evidente que fui um em milhões de trabalhadores de nossa geração que trabalhou nos trabalhos que havia em nossa época. Não fui nem melhor nem pior que meus pares, talvez tenha sido bastante esforçado e focado.

Como trabalhador do setor bancário, as oportunidades de aprendizagem foram diversas, nas mais diferentes áreas dos saberes humanos. 

No Unibanco, nos anos oitenta, trabalhei em agência e departamento. À época, o trabalho bancário era praticamente manual, com pouca tecnologia. Trabalhávamos com muitos papéis, com calculadoras, cheques e ordens de pagamento, cartões de crédito, e numerário, muito dinheiro em papel e escritural. Em agência, aprendemos cedo a lidar com gente. E eu tive a sorte de dar atenção aos representantes de nossa categoria, os dirigentes sindicais.

No Banco do Brasil, dos anos noventa adiante, passei a maior parte de minha vida de trabalhador. Foram décadas de dedicação ao trabalho bancário e ao povo brasileiro. Tive convites para sair do banco e atuar na área de minha formação em contábeis. Preferi seguir no BB. Sempre me vi como um servidor público. Nunca me imaginei como empresário ou empreendedor disso ou daquilo. Sairia do banco público somente se fosse para outra área do Estado, por querer servir ao povo e ao meu país.

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A última função que exerci como trabalhador bancário foi ser gestor eleito de uma autogestão em saúde. A experiência de representar milhares de colegas de trabalho, da ativa e aposentados, em uma associação tão importante para a vida das pessoas me fez mergulhar na função e na área como nunca havia feito na vida, por mais intenso que havia sido em tudo que fiz. Foi um mergulho de quatro anos praticamente sem dormir. Achei que tinha que recuperar um tempo que não havia tido em relação ao conhecimento daquilo que era responsável a partir do dia da posse na função.

Quando terminei a missão, quatro anos depois, tive comigo um entendimento que se somou ao sentimento que já tinha da existência, a ideia de que tudo que sabemos temos que passar adiante. Quando criei meus blogs há quase duas décadas, tinha essa visão das coisas. À época, meados da primeira década dos anos dois mil, criei um blog de cultura e outro sindical, e passei a fazer um esforço extra na agenda cansativa dos dias de representação para escrever sobre cultura e sobre a luta de classes no mundo do trabalho.

Foi dessa forma que fui escrevendo, estudando, aprendendo, escrevendo, fazendo política nas bases sociais, fazendo novo curso acadêmico em Letras, escrevendo, organizando a classe trabalhadora no setor no qual trabalhava, estudando a história do Banco do Brasil, das associações e sindicatos, a história das conquistas de direitos e a história da autogestão em saúde na qual fui diretor de saúde. E assim, aos poucos, fui escrevendo tudo isso que aprendi no trabalho e na política. 

Após um período escrevendo memórias neste blog (estou editando agora as memórias em formato de livro), talvez eu siga escrevendo aqui um novo tipo de memórias, mais focado nas experiências dos quatro anos vividos como gestor de uma autogestão em saúde, a Cassi. 

Quando terminei a missão naquela associação focada em saúde, fiz diversos textos de balanços do mandato. Quem sabe agora, olhando de longe as centenas de textos que fiz no calor da gestão, possa deixar aqui algumas contribuições sobre a área, porque o que mais ficou em mim é o quanto nós todos desconhecíamos (desconhecemos...) as questões inerentes a um setor que lida diariamente com algo tão delicado: a saúde e a vida das pessoas.

Após compreender melhor as grandes questões do setor de gestão de saúde, do sistema de saúde, dos atores do setor de saúde, percebi que seria fundamental divulgar para as pessoas comuns, usuários dos sistemas de saúde, detentores de direitos e obrigações em relação aos sistemas de saúde que existem, que as pessoas, os trabalhadores e seus representantes precisam ter noções das coisas do setor. A repetição da expressão não é cacoete de linguagem, é proposital. As pessoas precisariam ter noções mínimas dos setores e sistemas de saúde para lidarem melhor com isso.

Enfim, talvez eu discorra sobre minhas memórias da época que atuei com gestão de saúde em nome da classe trabalhadora.

William Mendes


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