Ainda é possível debater, argumentar, divergir e unir as pessoas em torno de objetivos comuns construídos de forma coletiva e plural? Podemos esperar do governo Lula uma mudança de diretrizes nos bancos e empresas públicas para deixarem de atuar como o setor privado atua?
Opinião
Osasco, 15 de novembro de 2022. Terça-feira.
As últimas semanas foram para mim um período de contatos com muitas pessoas, conhecidas e desconhecidas. As eleições brasileiras me fizeram sair de casa e me arriscar ao contato com os desconhecidos para buscar os indecisos e conquistar votos que pudessem tirar o país das mãos criminosas da milícia ocupando o poder central do Brasil. Relembrei um pouco do que vivi por quase duas décadas de representação política. A experiência me fez bem, me senti parte de uma luta e de uma conquista coletiva.
Os seres humanos de hoje estão muito diferentes dos seres humanos das décadas nas quais contatava pessoas para debater problemas comuns do mundo do trabalho e da cidadania para construir através de organização e mobilização direitos coletivos e um mundo diferente do qual criticávamos. Tive a oportunidade de lidar com seres humanos antes da criação das redes sociais que mudaram para pior o comportamento dos homo sapiens. Estamos virando bichos diferentes do que fomos nos últimos milhares de anos de evolução da espécie.
Apesar de começar essas memórias criticando o caminho pelo qual a nossa espécie vai, quero registrar momentos de esperança nas lutas coletivas, haja vista termos conseguido um grande feito ao derrotarmos a maior máquina de fraudes eleitorais de nossa história brasileira. A eleição de Lula contra tudo que enfrentamos demonstra que há chances de mudarmos as coisas para melhor, por mais difícil que seja a nossa realidade de classe trabalhadora. A eleição de Lula significa que se uma parte da humanidade quiser podemos nos unir pra salvar a natureza e a vida.
MILITÂNCIA POPULAR ESTÁ SE ORGANIZANDO
Neste sábado 12 participei de uma reunião de avaliação política da militância do Partido dos Trabalhadores da região do Butantã, zona Oeste de São Paulo. Que reunião boa tivemos! Mais de 80 pessoas presentes. Apesar de morar em Osasco, tenho uma relação de carinho e afeto com a região do Butantã porque nasci no bairro Rio Pequeno, cresci brincando nas ruas do bairro e me alfabetizei na Escola Estadual Prof. Adolfino Arruda Castanho.
O diretório do Partido na região é presidido por um companheiro bancário, um militante muito dedicado às lutas e um exemplo para tod@s nós. Ver a militância fazendo campanha me fez sair de casa e me unir a ela para conversar com as pessoas e lutar para mudar a trágica realidade brasileira que vínhamos enfrentando sob um governo genocida e criminoso.
Na reunião, ouvimos dezenas de pessoas, lideranças comunitárias, e ao final tivemos uma análise de conjuntura feita pelo querido companheiro José Genoino, um dos militantes mais antigos do diretório do Partido dos Trabalhadores da região do Butantã. Genoino é uma referência para mim e para tod@s nós que sonhamos e lutamos com um mundo mais justo e solidário.
Depois de duas décadas envolvido até os ossos com as lutas políticas da categoria bancária e da classe trabalhadora brasileira eu estava um pouco isolado do dia a dia das lutas coletivas. Participar de reuniões como essa de sábado me trouxe muitas memórias positivas do quanto é importante ouvir as pessoas, debater propostas e buscar soluções coletivas para melhorar a vida das pessoas.
Uma preocupação: estava observando as discussões da militância em uma rede social na qual me incluíram e em poucas horas vi duas pessoas começarem a divergir em uma questão, depois serem ríspidas uma com a outra, depois passarem a se ofender e ainda no mesmo dia terminaram com agressões e ofensas terríveis... gente, assim fica difícil construir um mundo melhor se não há tolerância e paciência para o básico da relação humana: divergir nas ideias... o desafio é grande!
BANCOS PÚBLICOS PRECISAM MUDAR AS DIRETRIZES A PARTIR DO GOVERNO LULA
Outra atividade social que tenho tido a oportunidade de participar de vez em quando é o contato com colegas bancários do Banco do Brasil, colegas da ativa e aposentados, momento no qual podemos compartilhar experiências atuais dos colegas nos locais de trabalho e às vezes comparar situações com algumas experiências que vivemos juntos quando estávamos no dia a dia da atividade bancária.
Na sexta-feira 11 conversando com colegas do banco sobre as funções sociais que o BB e os bancos privados priorizam e as que eles não querem fazer, pude ouvir a opinião sincera dos colegas ao se sentirem putos com a folga dos bancos privados em não receberem sequer os títulos deles mesmos, fazendo com que as pessoas queiram pagar no BB títulos dos bancos privados. Ouvi as justificativas dos colegas e eles têm razão de estarem na bronca. Mas também falei um pouco do que penso a respeito do papel dos bancos em geral e dos bancos públicos em particular.
Para que serve um banco, seja ele público ou privado? O que justificaria na atualidade a existência de um banco se as novas tecnologias e as novas formas de movimentação de meios de pagamentos mudaram radicalmente nas últimas décadas? Hoje, uma pessoa cria um banco digital, sem um funcionário sequer e começa a captar dinheiro das pessoas e fazer com o recurso o que bem entende... Para que serve um banco público ou estatal ainda hoje?
Não vou num espaço deste de memórias refletir sobre as questões acima. Aliás, tem gente mais competente e mais atualizada nos temas para fazer isso. Mas não esqueço as noções que tinha desde quando entrei na categoria bancária e me politizei nela, trabalhando desde os anos oitenta até recentemente.
Eu entendo que um banco, principalmente um banco público ou estatal, deve ser um parceiro da população do local onde atua. Um banco deve fornecer crédito de forma facilitada e com taxas justas, deve financiar pessoas físicas e jurídicas - setores da agricultura, indústria e comércio -, deve guardar de forma segura os recursos das pessoas e empresas, e também as contas oficiais dos governos e órgãos públicos. Um banco deve executar políticas públicas e ser o agente dos governos no apoio ao desenvolvimento econômico e social.
Um banco público deve atuar de forma a balizar o sistema bancário e financeiro inclusive quando os bancos privados não fazem o papel que deveriam fazer em benefício da coletividade. O exemplo mais claro disso foi o caso brasileiro durante a crise mundial do subprime a partir de 2008, quando o governo Lula e depois Dilma utilizaram os bancos públicos e oficiais para atuarem de forma anticíclica na política de crédito e apoio à economia do país.
Não à toa, tomamos dezenas de milhões de clientes dos bancos privados no período posterior à crise econômica mundial após o subprime, foi nos bancos públicos que a sociedade brasileira encontrou o apoio necessário aos seus negócios, e os bancos privados ficaram putos com o governo do PT e há suspeitas de que os banqueiros tiveram papel relevante na desestabilização do governo e apoio ao golpe de Estado em 2016.
Enfim, se o governo Lula quiser mudar alguma coisa em relação aos bancos públicos, é fundamental que comece mudando as diretrizes e metas estabelecidas a partir dos ministérios e conselhos de administração porque se as metas e o foco forem idênticos ao que perseguem a banca privada, fica impossível esperar outra coisa dos bancos públicos que não sejam metas abusivas, assédio moral ao corpo funcional, extorsão aos clientes e ao povo e a insatisfação de todo mundo, trabalhadores, clientes e usuários.
Imaginem, então, se o governo Lula não mudar as diretrizes e o foco dos bancos públicos com atuação privada atualmente, bancos como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BASA, BNB, BNDES e outras empresa estatais e públicas, como serão complicadas as relações internas e com a própria sociedade brasileira... imaginem!
Estou na torcida para que o novo governo tenha uma atuação diferente em relação ao governo de destruição que está terminando e em relação ao governo golpista que iniciou a destruição do patrimônio público e dos direitos coletivos e sociais do povo brasileiro.
É isso. Paro as reflexões e memórias por hoje.
William Mendes
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