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19.10.09

Terça, 27 de outubro (2o dia do Curso de Formação Sindicato, Sociedade e Sistema Financeiro)


Textos de Huberman, Rubem Alves e o filme Germinal.

PROGRAMAÇÃO 2º dia, terça-feira.

- os dois períodos, manhã e tarde, abordam a temática "trabalho e produção de riqueza".

Foram utilizados alguns textos e músicas. À noite, o filme para reflexão foi "Eles não usam black-tie" que ajudará nos trabalhos do dia seguinte.


MATERIAIS

5) Músicas: O cio da terra e Vai trabalhar vagabundo - Chico Buarque de Hollanda

6) Verbete: O trabalho

7) Texto: Bela solução - César Benjamin

8) Texto: Trabalhadores de todos os países, uni-vos! - Leo Huberman

9) Texto: Não há salário que pague a degradação - Rubem Alves

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Material nº 5

O cio da terra

Composição: Milton Nascimento e Chico Buarque


Debulhar o trigo
Recolher cada bago do trigo
Forjar no trigo o milagre do pão
E se fartar de pão

Decepar a cana
Recolher a garapa da cana
Roubar da cana a doçura do mel
Se lambuzar de mel

Afagar a terra
Conhecer os desejos da terra
Cio da terra, a propícia estação
E fecundar o chão

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Vai trabalhar vagabundo

Composição: Chico Buarque


Vai trabalhar, vagabundo
Vai trabalhar, criatura
Deus permite a todo mundo
Uma loucura
Passa o domingo em família
Segunda-feira beleza
Embarca com alegria
Na correnteza

Prepara o teu documento
Carimba o teu coração
Não perde nem um momento
Perde a razão
Pode esquecer a mulata
Pode esquecer o bilhar
Pode apertar a gravata
Vai te enforcar
Vai te entregar
Vai te estragar
Vai trabalhar
Vê se não dorme no ponto
Reúne as economias
Perde os três contos no conto
Da loteria
Passa o domingo no mangue
Segunda-feira vazia
Ganha no banco de sangue
Pra mais um dia

Cuidado com o viaduto
Cuidado com o avião
Não perde mais um minuto
Perde a questão
Tenta pensar no futuro
No escuro tenta pensar
Vai renovar teu seguro
Vai caducar
Vai te entregar
Vai te estragar
Vai trabalhar

Passa o domingo sozinho
Segunda-feira a desgraça
Sem pai nem mãe, sem vizinho
Em plena praça
Vai terminar moribundo
Com um pouco de paciência
No fim da fila do fundo
Da previdência
Parte tranquilo, ó irmão
Descansa na paz de Deus
Deixaste casa e pensão
Só para os teus
A criançada chorando
Tua mulher vai suar
Pra botar outro malandro
No teu lugar
Vai te entregar
Vai te estragar
Vai te enforcar
Vai caducar
Vai trabalhar
Vai trabalhar
Vai trabalhar

(aqui abrimos uma reflexão entre os participantes sobre os sentidos das duas músicas. Como cada uma descreve o trabalho? O trabalho é bom ou ruim, ou as duas coisas?

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Material nº 6

Verbete: O trabalho

TRABALHO: do latim tripalium, tripálio, designado instrumento de tortura composto de três estacas, ao qual era submetido o condenado, quando não empalado numa delas e ali deixado até morrer. Empalar é espetar pelo ânus, suplício comum na Antiguidade, para o qual a crucificação romana foi um avanço. A etimologia latina formou-se a partir do prefixo tri, três, e palus, estaca, poste, mourão. O étimo serviu de base à vinculação de trabalho e sofrimento, coerente com a condenação dos três personagens envolvidos no pecado original, que receberam penas diferenciadas: a serpente, a de rastejar sobre a terra durante toda a sua existência; a mulher, a de se sentir atraída pelo marido, ele dominá-la e ela sofrer nos partos; o homem, ganhar o pão com o suor do rosto até que voltasse à terra de onde foi tirado. Como se vê, Jeová foi mesmo durão. Nem férias, nem licença-prêmio, nem auxílio-maternidade e muito menos possibilidade de recurso a outros tribunais 

(...) A ideia do trabalho como sofrimento, porém, não estava presente na etimologia latina, vez que o verbo trabalhar era laborare; e trabalho, labor. No italiano predominou este sentido, de que são amostras as palavras lavorare e lavoro. No francês travail, ao contrário, a vertente é a mesma do português. 

(...) O Dia do Trabalho é comemorado em quase todos os países industrializados. A data remonta a um episódio trágico, ocorrido em Chicago, entre os dias primeiro e quatro de maio de 1886, quando a polícia matou diversos operários que protestavam por melhores condições de trabalho. Oito anarquistas foram presos e condenados à morte, um dos quais se suicidou e quatro foram enforcados. Três, porém, foram absolvidos. A consciência americana e a opinião pública não suportariam celebrar o trabalho em data tão sinistra. Nos EUA, o Dia do Trabalho é, desde 1894, comemorado na primeira segunda-feira de setembro (...)

(Extraído de SILVA, Dionísio da. A vida íntima das palavras: origens e curiosidades da língua portuguesa. São Paulo: Arx, 2002)

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Material nº 7

Bela solução - César Benjamin



VISTO EM perspectiva histórica, desemprego crônico é uma anomalia. Nenhuma sociedade antiga condenou grupos significativos de seus integrantes a uma existência desprovida de função. No mundo contemporâneo, porém, parte da população não consegue encontrar um lugar social definido. Parece um problema insolúvel, que, com a crise, volta a crescer.

Pelo menos três escolas, em economia, abordaram teoricamente a questão.

Para os neoclássicos, os fatores de produção (entre eles o trabalho) são usados até o ponto em que o seu custo iguala a sua produtividade marginal (ou seja, a produtividade da última unidade aproveitada). Se há desemprego, então o custo do trabalho está maior que a sua produtividade marginal. É preciso ajustar as duas variáveis. Como a produtividade é relativamente rígida no curto prazo, o ajuste se faz pela redução dos salários. Se pressões políticas ou sindicais impedirem esse movimento, o mercado de trabalho funcionará de forma imperfeita, com desemprego.

Keynes introduz outra abordagem. Demonstra que, no capitalismo, o pleno emprego dos recursos tende a gerar mais bens do que a quantidade que se consegue vender. Os empresários param de produzir (e de contratar) quando a oferta iguala a demanda, pois a partir daí cessa a possibilidade de lucro. Como esse ponto de intercessão é atingido antes do uso de todos os recursos disponíveis, o equilíbrio entre oferta e demanda de bens se estabelece antes de se chegar ao pleno emprego. Por isso, Keynes defende políticas para estimular a demanda e, coerentemente, afirma que a redução dos salários só agrava o problema.

A terceira abordagem é de Karl Marx. Para aumentar a produção de valor, ele diz, o capital precisa comandar parcelas crescentes da capacidade de trabalho da sociedade. Desprovidas de alternativas próprias de sobrevivência, as pessoas devem ingressar nas atividades produtivas controladas pelo capital em troca de um salário. Nessas atividades, porém, o progresso técnico incessante expele cada vez mais gente. Assim, agem juntas duas tendências que têm efeitos contraditórios: uma incorpora trabalhadores à esfera capitalista da atividade econômica, a outra lança trabalhadores na rua. A maioria da população passa a ser assalariada, mas parte dela se torna excedente, em um movimento contínuo. Marx considerou esse "exército industrial de reserva" como um componente estrutural da nova sociedade. Pois, graças a ele, o recrutamento de força de trabalho, necessário nos ciclos expansivos, não fica limitado pela taxa de crescimento vegetativo da população, que é declinante. 

Diferentes abordagens, diferentes propostas. 

A primeira afirma que os mercados se autorregulam e, deixados por sua própria conta, tendem a um ponto de equilíbrio em que a alocação dos recursos, inclusive do trabalho, tende a tornar-se plena. 

A segunda aponta que o equilíbrio entre oferta e demanda de bens, de um lado, e o pleno emprego, de outro, em geral não coincidem, o que exige políticas voltadas para incrementar a demanda. 

A terceira diz que, ao atrair e repelir força de trabalho na esfera produtiva, o capitalismo produz uma população excedente que, embora excluída, é funcional para a dinâmica do sistema.

Marx teria considerado frágil a terapia keynesiana para o desemprego, pois contra ela continuariam a operar o que chamou de "leis de tendência". Sua solução implicava combinar progresso técnico com diminuição planejada da jornada de trabalho, remetendo a existência humana, cada vez mais, para o mundo da cultura. O homem, dizia, deve aos poucos deixar de fazer o que as máquinas e a natureza podem fazer, para no limite dedicar-se ao que só ele pode fazer, como estudar matemática e compor sinfonias. Bela solução.

CESAR BENJAMIN, 53, editor da Editora Contraponto e doutor honoris causa da Universidade Bicentenária de Aragua (Venezuela), é autor de "Bom Combate" (Contraponto, 2006). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.


(Extraído do jornal Folha de S. Paulo, de 24/01/2009)


Os outros textos também abordaram o tema "trabalho". Tivemos excelentes debates após cada leitura.

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COMENTÁRIO BREVE

Sobre os textos de Leo Huberman e o de Rubem Alves, fechando o tema "Trabalho e produção de riqueza".

Na noite anterior, o filme "Germinal" é um soco no estômago! A forma como se apresenta a realidade do mundo do trabalho do século XIX, descrito através do mais puro naturalismo pelo escritor Émile Zola, e muito bem traduzido pelo diretor Claude Berri, em 1993, vai se encaixar em todas as discussões sobre o trabalho e a produção de riqueza pelos homens.

Começamos na terça-feira, 2º dia do curso, com as músicas "Cio da Terra" e "Vai trabalhar vagabundo". Ao longo do dia de debates e reflexões, após ler o verbete sobre "O Trabalho" traduzido como algo ruim, que traz sofrimento, e em seguida vendo César Benjamin e sua "Bela solução" para a questão da produção de riquezas e de coisas humanas, chegamos aos textos de Huberman e Alves.

Huberman aborda Karl Marx, seus estudos e a grande visão que nenhum outro estudioso havia tido ainda sobre a mais-valia, talvez o americano Abraham Lincoln tenha chegado perto em seus conceitos. Cito abaixo uma síntese das conclusões de Marx:

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"A teoria da mais-valia de Marx resolve o mistério de como o trabalho é explorado na sociedade capitalista. Vamos resumir todo o processo em frases curtas:

- O sistema capitalista se ocupa da produção de artigos para a venda, ou de mercadorias.

- O valor de uma mercadoria é determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessário encerrado na sua produção.

- O trabalhador não possui os meios de produção (terra, ferramentas, fábricas etc).

- Para viver, ele tem de vender a única mercadoria de que é dono, sua força de trabalho.

- O valor de sua força de trabalho, como o de qualquer mercadoria, é o total necessário à sua reprodução - no caso, a soma necessária para mantê-lo vivo.

- Os salários que lhe são pagos, portanto, serão iguais apenas ao que é necessário à sua manutenção.

- Mas esse total que recebe, o trabalhador pode produzir em parte de um dia de trabalho.

- Isso significa que apenas parte do tempo estará trabalhando para si.

- O resto do tempo, estará trabalhado para o patrão.

- A diferença entre o que o trabalhador recebe de salário e o valor da mercadoria que produz, é a mais-valia.

- A mais-valia fica com o empregador - o dono dos meios de produção.

- É a fonte do lucro, juro, renda - as rendas das classes que são donas.

- A mais-valia é a medida da exploração do trabalho no sistema capitalista".

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Huberman nos lembra que Marx não foi nenhum futurólogo, ele analisou processos ao longo da história humana, principalmente sob a ótica da produção material, e nos deixa grandes ensinamentos em sua obra. Vejam uma abaixo, citada por Huberman:

"Não é a consciência dos homens que determina sua existência, mas sim o contrário, é sua existência que determina sua consciência".

Por fim, uma das mensagens a nós é que a transição do feudalismo ao capitalismo foi um processo, conduzido pela classe burguesa, que era a nova força produtiva da época.

"As novas forças produtivas devem estar presentes, e com elas uma classe revolucionária cuja função é compreender e dirigir".

Quem se habilita?

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AGENDA


Volta de Minas Gerais para São Paulo na parte da tarde para compromissos na Contraf-CUT.


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